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“Marte Um”: Brasil no Oscar?

Sala lotada. Luzes se apagam, e ao serem acesas, ouço choros e fungadas de nariz. Uma sala inteira emocionada, com sorrisos tímidos de quem foi surpreendido por um furacão sutil chamado “Marte Um”.

O longa-metragem, escrito e dirigido por Gabriel Martins, conta a história da família Martins (não, não é uma autobiografia), que vive na região metropolitana de Belo Horizonte, em uma configuração de classe média baixa.

Sobre a narrativa

A narrativa mergulha nas histórias dos quatro personagens que formam a família: o pai, a mãe, o filho e a filha. Cada um apresenta seus dilemas, objetivos e desafios próprios, que, ao meu ver, são igualmente cativantes, algo extremamente delicado de se realizar quando estamos falando de roteiro.

Deivinho, interpretado por Cícero Lucas, é um garoto tímido cujo pai treina para ser, algum dia, um grande jogador de futebol. Apesar do talento do menino no esporte, ele guarda em si, quase que secretamente, outro objetivo de vida: ser astrofísico, e participar da primeira missão de colonização de Marte, chamada “Marte Um”.

Em contrapartida, seu pai, Wellington (Carlos Francisco), aposta todas as fichas, expectativas pessoais e até mesmo o futuro financeiro da família no filho em relação à carreira no esporte.

Do outro lado, a filha Eunice (Camilla Damião), estudante de direito, se apaixona e pretende sair de casa, o que gera mais uma camada de conflitos entre ela e a família, que ainda apresenta certa dificuldade em relação à independência da filha.

Enquanto isso, Tércia, interpretada pela fantástica Rejane Faria (que rouba a cena constantemente no filme), passa por um trauma um tanto peculiar, que a leva a crer que está atraindo acontecimentos ruins para a família e amigos.

Mescla de naturalismo com elementos pop

O longa-metragem consegue desenvolver de forma hábil a história e sonhos de cada um dos personagens, tecendo a visão que possuem com a ideia de futuro. Além disso, o projeto tem grande sucesso em expor como os objetivos de cada um entrelaçam-se com os dos outros e, inevitavelmente, com os rumos da família como um todo.

Através de uma linguagem que já vem de outros filmes da Filmes de Plástico, a produtora do filme cujo o diretor é sócio, “Marte Um” utiliza-se de uma narrativa inicialmente leve e despreocupada, mas que, silenciosamente, vai nos levando a caminhos que cativam o público, até o ponto de estarmos fisgados na história daquelas pessoas.

Gabriel Martins, diretor de “No Coração do Mundo”, filme que, particularmente, é um dos meus favoritos brasileiros dos últimos tempos, mais uma vez mostra-se um realizador de mão cheia.

O mineiro consegue mesclar o naturalismo com elementos pop brasileiros e internacionais, ao trazer tanto a figura de Neil deGrasse Tyson, astrofísico americano, quanto Tokinho, artista conhecido por aparecer em diversos programas de auditório. Além disso, Gabriel conduz com extremo talento todos os departamentos, em especial a sensível e magistral direção de fotografia assinada por Leonardo Feliciano.

Prêmios nacionais, internacionais e chance de chegar ao Oscar

“Marte Um” foi vencedor de Melhor Filme pelo Júri Popular, Melhor Trilha Musical, Melhor Roteiro e do Prêmio Especial do Júri no 50º Festival de Cinema de Gramado, além de ter sido selecionado para o Festival de Sundance, Tribeca e diversos outros festivais nacionais e internacionais.

Agora, o filme foi selecionado para disputar uma vaga para a categoria de Melhor Filme Internacional na 95º edição do Oscar. O filme, por si só, possui todas as chances, tendo em vista sua qualidade estética e narrativa. Juntamente, a realidade brasileira é retratada de forma extremamente forte e singular, outro grande ponto que é levado com seriedade pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.

Todavia, se o longa quebrará de fato a barreira que há anos o cinema brasileiro vem tentando romper, já é outra história. A seleção de Filme Internacional é um processo que orbita muito mais em torno da política, publicidade e relação interna dos próprios produtores e distribuidores do filme com os membros votantes da Academia.

“Parasita”, de Bong Joon-Ho, vencedor de quatro estatuetas na edição de 2019, incluindo de Melhor Filme Internacional, teve sua vitória evidentemente ligada ao enorme capital injetado na divulgação e campanha do filme. Este investimento veio tanto de produtores do filme quanto pelo próprio governo sul-coreano, que entende a importância do cinema como indústria e gerador de renda.

Desta forma, o futuro de “Marte Um” no Oscar depende muito mais de políticas públicas com o foco internacional (o que historicamente já não carrega tanta força no Brasil) quanto um planejamento inteligente de divulgação e distribuição internacional do filme nos Estados Unidos.

De qualquer forma, o longa mineiro apresenta uma história amorosa, potente e emocionante, que merece ser descoberta não apenas pelo mercado internacional, algo que já vem ocorrendo desde a indicação em Sundance, mas também pelo público brasileiro em geral.

“Marte Um” está em cartaz em diversos cinemas ao redor de todo o Brasil. Até o momento, já teve mais de 50 mil espectadores nacionais.

Confira o trailer:

Entre em contato com a redação Money Crunch: [email protected]

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