Por:
Diego Lazzaris
Maria Antônia Anacleto
A PEC da Transição, que permite o furo de teto de gastos para pagamento do Auxílio Brasil, foi apresentada ao Congresso na última semana e trouxe referência a um conceito bastante criticado no mercado financeiro: a Teoria Monetária Moderna (Modern Monetary Theory, em inglês).
Em linhas gerais, a Teoria Monetária Moderna diz que governos não devem se preocupar com restrições orçamentárias e endividamento, pois o Estado possui o poder de se financiar através da emissão de moeda.
Na prática, no entanto, a MMT (sigla em inglês) já mostrou toda sua ineficácia em diversos países. “O relatório da PEC citando MMT foi um absurdo completo. Eu não queria acreditar quando li. É ‘terraplanismo econômico’ puro, ainda mais em um país como o Brasil. Se nos Estados Unidos isso provocou a maior inflação desde os anos 1970, imagina aqui”, criticou o gestor João Luiz Braga, sócio-fundador da Encore Asset, durante live.
Braga se refere à forte injeção de liquidez promovida pelo Fed (Federal Reserve, o Banco Central norte-americano) durante o auge da pandemia de Covid-19. Até o final de 2021, o BC dos EUA já tinha despejado mais de US$ 4 trilhões na maior economia do mundo.
A consequência veio meses depois, com um forte aumento da pressão inflacionária nos EUA. O CPI (Índice de Preços ao Consumidor, na sigla em inglês) chegou a ultrapassar os 10% no acumulado de 12 meses, algo que não acontecia há quatro décadas.
Aqui no Brasil a inflação também mostrou as caras e deu um salto depois que o governo adotou medidas de injeção de liquidez para tentar combater os efeitos da pandemia na economia. O IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) também disparou e chegou a marcar inflação acumulada de mais de 12% em 12 meses em abril deste ano.
“O único caminho disso [adoção da MMT] aqui no Brasil seria mais inflação, que por sua vez é o imposto em cima dos mais pobres”, afirma Braga.
Veja o trecho da PEC da Transição que cita a MMT:
“Cabe enfatizar, como apontam alguns adeptos da MMT, que o aumento de gastos públicos não pode provocar crise de desconfiança em países que emitem dívida na própria moeda. Ou seja, se o financiamento das despesas fosse feito em moeda estrangeira, seria justificável uma preocupação com a solvência do país. Mas como os títulos emitidos pelo Tesouro Nacional são em reais, não existe a possibilidade de o governo não pagar”.
Subestima complexidade da economia
A Teoria Monetária Moderna é vista por muitos especialistas como um conjunto de proposições que subestimam as complexidades das economias atuais.
Economistas consideram que a MMT combina ideias antigas e heterodoxas, como imprimir dinheiro, colocar o governo para gastar e utilizar impostos para “retirar o excesso de dinheiro da economia”.
Como exemplificação, Antony Mueller, doutor pela Universidade de Erlangen-Nuremberg, Alemanha (FAU), e Samuel Vaz-Curado, mestre em Economia pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), citam que, ao longo da história, as propostas da MMT já se mostraram como errôneas.
“Gastos sem fim derrubaram o Império Espanhol com o influxo de ouro e prata das colônias americanas. A expansão maciça da oferta monetária durante e após a Primeira Guerra Mundial levou à hiperinflação na Alemanha, que destruiu sua classe média. Na América Latina, diferentes experiências com políticas semelhantes à TMM levaram à hiperinflação e ao colapso econômico. Esse foi o caso do Chile nos anos 1970, do Peru e da Bolívia nos anos 1980, e da Argentina e da Venezuela hoje.”, afirmaram os acadêmicos no artigo publicado no Mises Brasil.
Eles comentam ainda o caso do Brasil, que sofreu com o aumento generalizado de preços nas décadas de 1980 e início dos anos 1990. “O Brasil também vivenciou uma hiperinflação de preços como consequência da emissão exponencial de dinheiro. As agruras vivenciadas na década de 1980 foram consequências diretas deste arranjo. Desde então, o Brasil assumiu um setor público hipertrofiado, presente em todas as áreas, o que gerou um profundo traço de corrupção e uma aversão à confiança e à poupança.”
De forma geral, a Teoria Monetária Moderna implica em governo mais inchados, intervendo mais sobre as dinâmicas da economia e, juntamente, maiores gastos e impostos.
Como surgiu
Por mais que possua “moderna” em sua denominação, a MMT está relacionada com ideais defendidos muito anteriormente, especificamente pelo economista alemão Georg Friedrich Knapp, precursor da chamada teoria “cartalista”.
Em sua obra “The State Theory of Money”, publicada no ano de 1905, Knapp defende que o dinheiro é uma criatura do estado, de forma que ele apresenta poder de compra à população justamente por conta do decreto governamental. Portanto, o dinheiro não pode ser visto como uma commoditie.
Por conta dessa aproximação, muitos economistas identificam a Teoria Monetária Moderna como “neocartalista”.