Há alguns meses circulam manchetes sobre prejuízos do Fed (Federal Reserve, o Banco Central norte americano), principalmente na mídia internacional. Mas você sabe o que provocou isso e o que pode acontecer caso as perdas permaneçam?
O analista Renan Zanella, da Convex Research, explica que desde a grande crise financeira de 2008, o Fed implementou uma política monetária chamada de Quantitative Easing – ou Afrouxamento Monetário, em tradução livre. “Essa política envolve a compra de títulos negociados no mercado, principalmente títulos do tesouro americano”, diz.
O balanço de ativos do Fed vinha crescendo desde então. E em 2020, após a pandemia, o BC americano comprou ativos como nunca. “Tivemos um movimento extremamente relevante do balanço de ativos do Fed, que chegou a praticamente US$ 9 trilhões”, afirma Zanella.
Na renda fixa, há uma regra básica: quando a taxa de juros cai, o preço do título sobe. Então, quando a taxa estava baixa, o Fed tinha valorização do seu balanço de ativos. No entanto, com o aumento dos juros, os títulos de dívidas que estavam na carteira do Fed começaram perder valor, o que foi uma das causa do prejuízo na marcação a mercado (valor atual do título).
“Os ativos do Fed depreciaram por conta da alta de juros”, afirma Luciano Feres, economista e CFO da Somus Capital.
Além disso, em 2021, os bancos com excesso de liquidez passaram a deixar o excedente com o Fed, que retribuía pagando juros. “Este é um mecanismo utilizado para drenagem de liquidez”, afirma Zanella.
Segundo o analista da Convex, o Fed costumava ter resultado positivo nestas operações. “Os títulos em carteira rendiam mais do que o BC tinha que pagar sobre as reservas mantidas na instituição. No entanto, recentemente, os juros pagos sobre as reservas excedentes começaram a ser muito maiores do que o rendimento que o Fed tinha no seu balanço de ativos”, diz.
Victor Inoue, head de produtos na WIT Invest, explica que assim como um banco tradicional, o Fed possui um balanço com ativos e passivos, e a alta de juros trouxe um descasamento entre esses 2 fluxos. “Do lado dos ativos, o Fed carrega principalmente Treasuries de longo prazo e ativos de baixo risco como MBSs (mortgage backed securities)”, diz.
O problema é que seu passivo é sensível à taxa de juros determinada pelo próprio Fed (Fed Funds Rate – FFR). “Ou seja, devido ao aumento do FFR o retorno dos seus ativos ficou abaixo de suas obrigações, tornando sua margem financeira negativa”, explica.
O que acontece agora?
A pergunta que muitos se fazem é o que pode acontecer, de fato, após o BC dos EUA registrar grandes prejuízos.
Segundo Inoue, no curto prazo não devemos ter consequências acentuadas. Isso porque ao contrário de um banco tradicional, o Fed é capaz de emitir moeda, sendo capaz de honrar com seus passivos.
No entanto, ele afirma que caso o Fed não consiga equilibrar seu balanço de forma orgânica, sendo obrigado a imprimir dólares para pagar suas dívidas, teríamos um problema de confiança. “A reação do mercado a um balanço fragilizado do Fed pode levar a problemas de credibilidade que diminuíram a capacidade da autoridade monetária implementar suas políticas”, afirma.
Zanella concorda que o fato de o Fed ter o poder de emissão de moeda deixa a situação menos problemática para o BC dos EUA. “O Fed nunca irá a falência. Isso porque ele tem o monopólio da moeda, é o criador das reservas bancárias. Mas, isso mostra que estamos vivendo um período único na história, principalmente no mercado de Bonds”, conclui.
Para entender melhor sobre a situação, veja o vídeo em que Renan Zanella explica o balanço do Fed: