Imagine se você precisasse trabalhar 149 dias em um ano apenas para quitar um débito, sem colocar nenhum tostão no bolso durante todo esse período. Isso quer dizer que o primeiro real só cairia na sua conta no 149º dia do ano, depois que toda a sua “dívida” fosse quitada.
Parece algo impensável? Pois levando em consideração a carga tributária do Brasil, essa comparação faz sentido. Segundo um estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), o brasileiro precisou trabalhar 149 dias apenas para pagar impostos em 2020.
A carga tributária bruta brasileira atingiu 31,64% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2020 (último dado oficial disponível), de acordo com dados da Receita Federal.
Segundo a Receita, 66,44% de toda a carga é atribuída à União, que arrecadou R$ 1,563 trilhão – equivalente a 67,53% do PIB. O restante da carga global foi obtido a partir dos estados, que contribuíram com 26,8% do total (R$ 635,1 bilhões), e dos municípios, que receberam 5,8% do total (R$ 158,2 bilhões).
Além da alta carga de impostos, Richard Rytenband, economista e CEO da Convex Research, destaca que o sistema tributário brasileiro é um dos mais injustos do mundo, já que grande parte da arrecadação (mais de 40%) do governo vem dos impostos sobre bens e serviços.
Com esse sistema, o rico e o pobre pagam a mesma alíquota de imposto, sem que haja nenhuma distinção em relação à sua capacidade financeira.
Para ficar mais claro, imagine que um quilo de feijão custe R$ 8, dos quais R$ 4 sejam referentes aos tributos. Logo, uma pessoa que ganha R$ 50 mil por mês vai pagar exatamente o mesmo imposto sobre o feijão que um trabalhador que ganha R$ 1.212 por mês (um salário mínimo). “Proporcionalmente, as pessoas mais pobres são muito mais impactadas”, diz o economista.
Rytenband destaca outro problema em relação aos impostos no Brasil: a complexidade tributária para as empresas, que prejudica principalmente os pequenos e médios empreendedores. “Eles gastam um tempo absurdo para calcular todos os impostos que devem pagar. Precisam ter conhecimento sobre todas as regras e leis, caso contrário terão de contratar pessoas qualificadas para isso. Ou seja, muitas vezes o empresário gasta mais tempo focado na parte tributária do que no seu próprio negócio”, critica.
Isso diminui a eficiência das empresas, prejudica a competição e causa uma distorção na cadeia produtiva. “Ao invés de disputar consumidores com produtos e serviços melhores, as grandes empresas focam encontrar brechas na legislação e tentam se aproximar dos grupos de poder para terem privilégios”.
Investidores também são penalizados
Não bastasse a injustiça em relação aos mais pobres e a complexidade para as empresas, os investidores pessoa física também sofrem com a questão tributária. Quem investe em ações, por exemplo, tem de lidar com uma série de regras para calcular os impostos a serem pagos sobre os lucros na Bolsa.
Além disso, a isenção para vendas até R$ 20 mil por mês está totalmente defasada. “Se fosse corrigida da maneira correta, a isenção deveria ser de pelo menos o dobro desse valor”, afirma.
Outra discussão que está em pauta é a possibilidade de tributação sobre dividendos pagos pelas empresas listadas na Bolsa e sobre os rendimentos dos fundos imobiliários. Ambos têm como uma das principais vantagens a isenção de IR para investidores pessoa física, benefício que o governo vem tentando acabar. “Isso prejudicaria muito os pequenos investidores. Muitos investem nesse tipo de ativo pensando no longo prazo, justamente por conta da vantagem tributária”, destaca o economista.
Para o CEO da Convex, inserir novos impostos é a maneira errada de lidar com o déficit fiscal que vem assolando o Brasil e foi acentuado pela pandemia de Covid-19. Segundo ele, o governo deveria focar no corte de gastos públicos e reduzir a tributação.
“Vários estudos comprovam que a única forma de fazer um ajuste fiscal que realmente funcione é com uma redução agressiva os gastos e a diminuição de impostos. Deu certo em países como a Irlanda, que fez isso após a crise de 2008”, exemplifica.